quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Belregard: A Era das Revelações (de 01 DA à 900 DA) Parte II

Como já era de se imaginar, a antiga Rastov viu-se sitiada por dentro. Com a morte de Larsen, os Dwethären acionaram uma série de túneis subterrâneos que haviam construído sob a cidade e assim puderam surgir de dentro, pegando os moradores daquela comunidade rústica com a moral extremamente baixa, e ainda surpreendidos. Mas a Legião não havia sobrevivido por pura sorte, aqueles homens eram verdadeiros guerreiros temperados numa luta contra selvagens e contra o próprio clima. Ninguém chorou pela morte de Larsen e o luto foi marcado por sua alcunha, o vermelho. Os moradores do baronato mais fanáticos defendem a ideia de que o sangue Dwethären lavou as ruas da cidade, fazendo com que homens caminhassem com sangue cobrindo-lhes os calcanhares.

Aparentemente, o golpe dos selvagens deu errado em Rastov e, dessa maneira, uma nova ordem acabava por ser determinada. O primeiro ataque dos senhores das rochas falhou, mas ainda existiam às centenas nas montanhas que cercam a região. Com o conhecimento apreendido, de engenharia e arquitetura, grandes avanços foram possíveis, em especial a descoberta do arco. Toda a característica ornamental do norte de Belregard hoje vem deste momento, onde os homens aprenderam com os Dwethären este segredo de engenharia que permitiu a criação de grandes estruturas, como a Catedral do Deicídio. A metalurgia também recebeu sua cota de avanço e em menos de uma década todo homem que pudesse lutar carregava uma lâmina de aço temperado do Monte Halak. Estas mesmas lâminas que hoje são verdadeiras lendas em qualquer história cavalheiresca.

O combate contra os Dwethären foi extremamente lento. Nenhum líder foi posto no lugar de Larsen e os exércitos rapidamente foram divididos entre os subordinados mais confiáveis do Vermelho. Parecia que a morte do lendário Orador não havia impactado a ninguém. Os homens, excepcionalmente bem treinados e armados, iniciaram uma verdadeira guerrilha subterrânea com os Dwethären, usando os mesmos túneis que serviram para invadir a velha Rastov.

A Saga dos Quatro Fantasmas narra com detalhes os processos da guerra lenta contra os Selvagens das montanhas. Seus líderes entraram para a história da humanidade, devido à bravura e a conquista. Ralav, o feio, liderou a legião norte que combateu ferrenhamente os Dwethären. Sua alcunha foi recebida devido às inúmeras mutilações que ele sofreu no campo de batalha. Thordren, o alto, concentrou seu esforço no lado leste, dando cabo de controlar as forças inimigas no braço das montanhas que se fechava por aquele lado. Draken, o cauteloso, manteve-se nas muralhas de Rastov construindo e aperfeiçoando todas as descobertas advindas do contato com Dwethären. Por fim temos o relato dos feitos de Karn, o branco, que apoiou os exércitos de Ralav e Thordren antes de partir para o sul, no intuito de refazer um contato com Virka.

A primeira cidade ainda experimentava o governo liderado pelo grupo de Oradores e quando Karn assistiu aos abusos que estes praticavam, sentiu que deveria agir. Sem uma liderança verdadeiramente iluminada pela sabedoria do Único, os Oradores sentiam-se na liberdade de submeterem todo o povo à sua vontade, nem mesmo a nobreza escapava de seus caprichos excêntricos. Carregando o título de legionário, exigiu falar com aqueles homens e foi prontamente ignorado, além de ameaçado. Ofendido e envergonhado com o destino daquela cidade, o bastião da humanidade, Karn uniu-se aos insatisfeitos e tramaram uma revolta.

Foi num crepúsculo vermelho, em 370 DA, que o Levante dos Alvos tomou a catedral de Virka de surpresa. Guiados pelo experiente Karn. e armados com o segredo aço que ele trouxe do norte, nobres, camponeses, homens livres e servos lutaram lado a lado numa nova tentativa de devolver a cidade ao seu estado de direito, como um centro da fé humana no deus Único. Perdidos em suas libações e excessos, os Oradores não tiveram chance de se defenderem, mas para a surpresa do próprio Karn, eles ainda eram capazes de operar os milagres que apenas o Único poderia permitir, deixando claro que ainda eram favorecidos por Deus, mesmo comportando-se daquela maneira. Isso criaria um cisma na fé em Belregard.

A Karn foi oferecida a chance de tornar-se o Eleito de Virka, mas o guerreiro recusou. Ao invés disso, assumiu o controle militar da cidade e escolheu, ele mesmo, um grupo de fiéis para formar o novo secto de Oradores. No momento em que ele nomeou um servo para o cargo, gerou grande descontentamento da nobreza, mas esta pressão não o fez mudar de ideia. O soldado tinha plena noção de que não estava pronto para o cargo de Eleito e assim dedicou-se a colocar Virka nos eixos novamente. Conservador até a última fibra do corpo, no que diz respeito à ordem, Karn não demorou a reestruturar toda a cidade trazendo implementos do norte. A partir daquele momento o governo de Virka estaria dividido para sempre, contando com um grupo de Oradores e um líder militar, que carrega o título de Karnorum, em homenagem a este grande homem.

Com o passar dos séculos, o contato entre as cidades de Belregard ia sendo restabelecido. O primeiro foi entre Virka e Rastov, evidentemente. O apoio militar foi imediato, já que o homem culpado pelo progresso de Virka havia sido um membro da Legião Fantasmagórica. A máquina humana de guerra e pureza voltava a funcionar e o império do Único crescia a cada dia. Belinarens ainda eram perseguidos nas florestas, encurralados no ponto mais a oeste do continente eles tiveram seu fim, sob o julgo imparcial do Orador Borislav. Como registrado por um soldado presente, no ano de 450 DA: “Venham irmãos! Ergam as armas e clamem pelas aves do Criador! Que o sol torne-se negro pelo vulto de asas sombrias! Nós traremos a eles a revelação! Dizem-se senhores da floresta? Que assim seja! Que seu sangue nutra a terra e que sua carne alimente as árvores!”, nós traríamos a eles a revelação de que sempre fomos os eleitos e escolhidos do Único.

Com um pequeno grupo de homens de armas e prelados enviados à Belghor, as figuras dominantes de Belregard, naquele período, imaginavam ter o mundo em suas mãos. A verdade, porém, era um pouco diferente. Se estivéssemos realmente limitados a infestações como a dos Belinarem e Dwethären, tudo realmente estaria sob controle, mas nossos inimigos eram muitos. Outros Selvagens surgiam a cada passo nosso contra o desconhecido. Civilizações blasfemas que insultavam tudo aquilo em que acreditamos, escondiam-se nas sombras do mundo. Era como ver paródias de nós mesmos. Tentativas falhas de criar o ser perfeito, jogadas no meio dos ermos para serem esquecidas pelo tempo, mas agora o Único não deveria envergonhar-se, já que estávamos prontos para promover a sua limpeza.

Não só de seres longevos e mortais faziam-se os nossos inimigos. Depois de um longo tempo de embates contínuos, o Único mandou-nos um novo sinal. Este sinal foi interpretado pelo Orador Dankhil, em 749 DA. Segundo o que lhe foi passado, a única maneira de encerrar o ciclo de vida dos Selvagens, já que eles poderiam encarnar novamente no mundo, era matando sua personificação em Belregard. O que viria a ser isso? O Único desejava que nós, literalmente, matássemos os deuses dos Selvagens. Estes deuses, seres poderosos, haviam sido os primeiros a serem criados e assim detinham a influência e o poder de toda uma linhagem. Adormecidos e escondidos nos confins mais profanos do mundo, precisariam ser encontrados e aniquilados.

Alguns homens novamente titubearam, alegando que estes primeiros eram também filhos do Único e que esta guerra de irmãos deveria terminar. Eles não foram ouvidos. O motivo dos relatos históricos citarem apenas os Belinaren e os Dwerthären é exatamente por termos encontrado seus primogênitos. As guerras diretas foram deixadas de lado e um grande esforço iniciou-se para que tais entidades encarnadas fossem encontradas. Os locais verdadeiros são guardados em segredo, na tumba daqueles que investiram contra os mesmos, e alguns outros ainda são caçados hoje.

Apesar das investidas terem dado certo, estava claro que o consenso não mais existia e este atrito de opiniões não demorou a gerar sangue. Belregard estava prestes a mergulhar em uma nova era de caos, quando o impensável aconteceu... As fontes deste evento épico divergem entre si quanto a descrição de como ocorreu, mas nós temos uma certeza. O Único encarnou em Belregard, para passar as últimas lições à humanidade.

Do diário de Karn IV, Karnorum de Virka, ano 900 DA: “Eu não saberia descrever aquela luz. Ao bem da verdade, não era uma luz. Era como um véu incandescente. Ele deslizou por sobre minha pele, quente e ameno ao mesmo tempo. Eu pude sentir o fulgor da fé se espelhando pelo chão de pedra de minha cidade, minha pobre cidade que parecia um brinquedo infantil construído na areia, diante da imagem daquele colosso. O Único veio até nós como um comandante que precisávamos. Nem mil mãos poderiam fabricar um peitoral tão fino e ornamentado quanto o dele, sua lança parecia carregar o próprio sol na ponta e seu olhar dizia tudo o que se precisava saber”.

“O horror! É o que eu digo! Tolos são aqueles que se deixaram enganar pela ilusão de um impostor. Eu rio na face daquele que chamam de Único e ainda debocho sobre as oferendas prestadas a ele. Este é o nosso fim, crianças! Escutem o que eu digo, não restará nada quando nossos líderes baixarem a cabeça diante deste farsante!”, discurso de Dönar, diante da Catedral de Virka, ano de 900 DA.

“Os prisioneiros reagiram de forma estranha no momento em que toda a atenção de Belregard voltou-se aos céus. Era estranho, mas alguns deles fitavam o teto de pedra do calabouço, maravilhados com uma imagem que não existia. Estariam eles loucos? Ou foi um reflexo da vinda de nosso Criador? Outros gritavam até as gargantas sangrarem, devoravam os próprios lábios de aflição enquanto tentavam arranhar a parede para cavar uma saída. Suspeito que a presença de nosso Senhor seja capaz de revelar quem é quem em seu grande plano”, das anotações de Nelis, carcereiro do calabouço de Virka, ano de 900 DA.

Os exemplos de descrição são inúmeros. Novamente, foi depois deste momento de pura graça e revelação, para nós, que a fé em Belregard passou a ser vista de outra maneira. Os homens passaram a entender que o Único não nos julgava por sermos bons ou maus, ele nos criou desta maneira e cabia a cada um seguir o seu próprio caminho. Ele era, encarnado, exatamente aquilo que esperávamos que ele fosse. A Vinda do Único marcou o fim da Era das Revelações e logo nós entenderíamos o que o motivou a tomar tamanha atitude. Para a nossa eterna tristeza e, porque não, vergonha. 

4 comentários:

  1. Excelente, caro amigo!

    Tu pretendes preparar uma espécie de cenário ou suplemento quando toda a história (ou boa parte dela) estiver escrita?

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  2. Ah sim, certamente. Assim que eu tiver mais coisas pra trabalhar, pretendo seguir em frente. Estou tentando elaborar uns mapas agora, que sempre ajudam a decidir melhor as coisas.

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  3. Mapas de fato ajudam muito, e eu particularmente tenho uma dificuldade enorme em elaborá-los.

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  4. Estou planejando usar algum destes programas e fazer um voltado pra cada Era de Belregard. Pra mostrar as mudanças que os homens causaram no meio ambiente. Ai, depois, preparar algum mais elaborado e rebuscado.

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